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Anápolis é epicentro de polêmicas sobre o aborto desde a década de 90

de Redação
8 de outubro de 2020
em ESPECIAL!
Reading Time: 9 mins read
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Anápolis- Foto JC Potenciano

Anápolis- Foto JC Potenciano

REPORTAGEM ESPECIAL
Por Claudius Brito
Vander Lúcio Barbosa

28 de setembro de 2020. Anotem esta data, porque ela carrega viés importante dentro da história do Município de Anápolis, que se tornou uma espécie de epicentro de um debate sobre um tema que é controverso no Brasil e em quase todo o resto do mundo: o aborto.

Ainda mais, quando um dos personagens desse debate é um padre, considerado, por muitos, como fundamentalista (aquele que acredita nos seus dogmas como verdade absoluta, indiscutível, não colocando de parte, contudo, a premissa do diálogo, segundo a definição encontrada na Wikipédia).

No dia 28 de setembro de 2020, o Supremo Tribunal Federal confirmou uma sentença do Superior Tribunal de Justiça, condenando o padre Luiz Carlos Lodi da Cruz a pagar uma indenização de R$ 398 mil ao casal Tatielle Gomes e José Ricardo Dias.

O caso, que ganhou grande repercussão na imprensa em todo o País, remonta ao ano de 2005, quando Tatielle, então com 19 anos de idade, fez um exame e descobriu que o feto que carregava no ventre tinha uma anomalia rara (e incurável), conhecida como Síndrome de BodyStalk, que impossibilita a vida extrauterina do bebê uma vez que o cordão umbilical é inexistente e não há fechamento da parede abdominal do embrião, deixando os seus órgãos expostos.

Tatielle morava em Morrinhos, município localizado a cerca de 160 quilômetros de Anápolis. Ela teve de vir para Goiânia e, na época, foi orientada a pedir autorização para a interrupção daquela gestão de alto risco. Foram vários exames e, enfim, quando ela já ia fazer o procedimento, a equipe médica foi surpreendida com a chegada de um habeas corpus para que o ato cirúrgico fosse interrompido. O autor do pedido à Justiça foi o Padre Lodi, então já conhecido nacionalmente por fazer uma cruzada antiaborto, através de uma ONG idealizada e liderada por ele, a Pró-Vida de Anápolis.

Com a decisão, Tatielle teve de voltar para Morrinhos e a sua situação se agravou, não havendo alternativa, então, senão a realização do parto. O feto não teve chance de sobrevivência, como já era previsto.

Três anos mais tarde, o casal decidiu acionar o Padre Lodi na Justiça, por danos morais, pelos momentos difíceis e pelos traumas que vivenciou com toda aquela situação. Demorou quase quatro anos, para que a 13ª Vara Cível da Comarca de Goiânia desse o seu despacho. Assim, em 2012, o pedido foi julgado improcedente em primeira instância. Houve apelação ao segundo grau. Em 2013, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás manteve a decisão inicial.

A batalha foi parar no STJ, onde o casal obteve decisão favorável, através do despacho da ministra Nancy Andrighi. Isso, já em 2016. Ela sentenciou o Padre Lodi ao pagamento de uma indenização de R$ 60 mil. Agora, em 2020, o Supremo Tribunal Federal, por decisão do ministro Dias Tóffoli, encerrou o processo ao reconhecer a decisão do STJ. Em valores corrigidos, a indenização aplicada ao pároco chega a R$ 398 mil.

Debate sobre o aborto tem vários capítulos em Anápolis, com fatos e debates calorosos

O caso de Tatielle é um recorte de uma sequência de vários fatos e debates sobre a questão do aborto em Anápolis. Na verdade, muito anteriores, porém, não menos permeados por polêmicas e marcas que ficaram na vida de muitas pessoas.

Médico Maurício Machado: perseguições

Uma delas é o médico ginecologista Maurício Machado. Profissional já conceituado, ele afirma que sofreu muitas perseguições pelo Padre Lodi e seguidores dele. O motivo: estar à frente do CIM, o Centro Integrado da Mulher que, como o próprio nome já diz, era uma unidade especializada em prestar diversos tipos de atendimento ao público feminino.

Maurício Machado lembra que, através do CIM, em parceria com a Universidade de Campinas (Unicamp), Camicamp, Reprolatina e Universidade de Michigan, Anápolis passou a contar com um projeto inédito no Município, na área de saúde sexual e reprodutiva da mulher, sendo que uma das vertentes em relação ao planejamento familiar era a inserção do DIU- Dispositivo Intra Uterino, como método contraceptivo, disponibilizado à época pelo Ministério da Saúde.

O médico conta que, por iniciar o uso do DIU, foi chamado de “abortista” pelo padre Lodi que, com os seus seguidores, distribuíam panfletos condenando aquele trabalho que era realizado para as mulheres de baixa renda, porque as de melhor poder aquisitivo, poderiam fazer uso do DIU através de uma consulta particular. Ou seja, não havia ilegalidade. Entretanto, conforme lembra, o padre chegou a dar queixa contra ele no Ministério Público. Um jornal da época mostra que o nível dos ataques era forte, buscava ridicularizar as pessoas envolvidas e beirava o ódio.

Em razão dessa movimentação, pontua Maurício Machado, muitos casais de baixa renda, à época, ficaram privados dos seus direitos de escolherem os métodos anticoncepcionais que eram aprovados no País e oferecidos na rede pública, “devido ao homem de batina longa e preta”. Para o médico, um retrocesso que remete ao obscurantismo da idade média.

O CIM

O Centro Integrado da Mulher foi implantado em Anápolis na administração do então prefeito Adhemar Santillo (1997-2000). Onaide Santillo, então primeira-dama, recorda que a implantação da unidade foi um dos projetos da campanha do marido e, logo no início do governo, após a eleição, começou a ser colocado em prática, sob a coordenação do médico Maurício Machado, que tinha ligações estreitas com a Unicamp.

Montado ao lado do Terminal Urbano, na Praça Americano do Brasil, o CIM tinha em sua estrutura atendimentos às gestantes, o Banco de Leite Materno, o núcleo de Planejamento Familiar, o de Prevenção Oncológica e, ainda, os núcleos voltados à atenção de adolescentes e mulheres na fase do climatério/menopausa.

Onaide Santillo lembra que, no dia da inauguração do CIM, que era considerado um programa de referência para Goiás e o País, custeado, naquela época, apenas com recursos próprios da Prefeitura, o padre Lodi apareceu no local com algumas pessoas e perguntava aos presentes “onde era a sala do aborto?”

Apesar do incidente, Onaide relata que o trabalho teve sequência e o CIM iniciou as suas atividades e atraia a atenção de diversas cidades. O Banco de Leite, inclusive, dava suporte para Goiânia. “Então, não era só a questão do Planejamento Familiar, do DIU”, observou, acrescentando que o trabalho era muito mais amplo.

Porém, destaca Onaide, o padre Lodi saia às igrejas fazendo o discurso de que o CIM era lugar de aborto. Tendo em vista essa animosidade, a Prefeitura decidiu organizar um seminário, trazendo especialistas no assunto, para falar sobre o método anticoncepcional que, segundo explica impede a ovulação, ou seja, que o espermatozoide masculino chegue ao útero feminino. O pároco até esteve no local, mas não se deu por vencido. E continuo com o seu movimento.

Visita ao Bispo

Casal Adhemar Onaide Santillo:
visita ao bispo por solução

Onaide Santillo conta que ela e Adhemar decidiram, então, fazer uma reunião com o então Bispo Diocesano Dom Manoel Pestana, no intuito de explicar a ele o trabalho desenvolvido no CIM.

Nessa reunião, conta, o próprio Dom Pestana, a fim de dirimir o conflito, propôs que se retirasse o DIU do programa. Após essa ponderação e a fim de manter o CIM em funcionamento, o prefeito Adhemar Santillo encaminhou à Câmara Municipal um projeto proibindo a distribuição e implantação do DIU no CIM e demais órgãos da saúde pública municipal. A proposta foi aprovada e foi convertida na Lei Municipal 2.650, de 08 de julho de 1999.

CIM continuou com as suas atividades, embora sem a parte do DIU, até o final do Governo de Adhemar Santillo e, apesar de ser um programa inovador, sobretudo, para aquela época, não foi mantido pelo governo sucessor.

Onaide Santillo pondera que o CIM cumpriu um papel importante na saúde pública de Anápolis, no entanto, em sua opinião, muitas mulheres de baixa renda não puderam ter toda a assistência a que teriam de direito, em razão daquele trabalho que tentava cravar no programa o cunho de abortista. O que, segundo ela, nunca foi.


Padre afirma que não tem condições de pagar indenização.
“Só tenho livros”, afirmou em uma entrevista

A reportagem tentou entrar em contato com o Padre Luiz Carlos Lodi, através de um e-mail da organização Pró-Vida. Entretanto, não houve resposta. Mas, na última quinta-feira, 1º/10, ele concedeu uma entrevista ao repórter Wagner Almeida, da Rádio Manchester FM 93,3 e falou sobre a condenação.

Padre Lodi: polêmico e reconhecido nacionalmente por luta contra o aborto

Padre Lodi destacou, na entrevista, que como estudante de Direito, participou da própria defesa, no processo sobre o caso Tatielle. Ele afirmou que depois de três anos do fato ocorrido, o casal envolvido foi orientado a “tirar dinheiro do padre” para compensar “uma aflição”. E, conforme disse, o advogado “entrou com uma ação doida” e não quis processar o desembargador [que não deu provimento ao pedido da defesa, em segunda instância], “porque não poderia acusá-lo de fundamentalismo religioso”.

O pároco continua, na entrevista, relatando que o processo subiu ao STJ e lá, segundo ele, decidiu-se que ele era culpado, porque estaria usando da religião para barrar o direito que teria a vítima.

“Tentamos entrar com recurso, mas não deu certo”, narrou o Padre Lodi, pontuando que o processo foi remetido ao STF e, lá não se julgou o mérito, porque o mesmo já havia sido provido no STJ.

O religioso rotulou a situação de um “espetáculo midiático” e disse, enfático, que não se envergonha de sua luta, nem de ser católico. E que tentou fazer a sua defesa usando argumentos do Direito [não da religião]. “Distorceram, para fazer a igreja de vilã e valorizar a causa abortista”, criticou.

Sobre o pagamento da indenização, Padre Lodi disse que não tem o dinheiro e nem está fazendo campanha de arrecadação, as chamadas vaquinhas. Ele disse possuir apenas livros, mas estes não servem para pagamento. “Se pegarem a minha escova de dentes, não vão conseguir”, ironizou, dizendo que abriu-se um precedente no Judiciário, pois “a pessoa poderá ser processada porque a Justiça atendeu um pedido dela”, disse, referindo-se ao fato de que fora a própria Justiça que deu provimento ao habeas corpus que interrompeu o ato cirúrgico que Tatielle iria fazer em Goiânia para a retirada do feto.

Quando perguntado se a repercussão do caso poderia trazer um prejuízo ao trabalho da imagem de seu trabalho no movimento Pró-Vida, ele respondeu que fez uma live, da qual teriam participado entre 500 e 600 pessoas. “Pode ser que o feitiço vire contra o feiticeiro”, ironizou novamente, demonstrando que a história não terminou. Foi, apenas, mais um capítulo.

Propaganda da época do CIM, que era referência em atendimento à mulher
Rótulos: capa

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Comentários 2

  1. Marcos Vieira says:
    5 anos atrás

    Ótima reportagem. Obrigado.

    Responder
  2. Leitor desse lixo de matéria says:
    2 anos atrás

    Que lixo de matéria.

    Responder

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