No Brasil, estima-se que por dia oito crianças sejam abandonadas. Muitas delas vão para as unidades de acolhimento. Em Anápolis, projeto busca inovações nessa área
Pelo menos, oito crianças são abandonadas por dia no Brasil, segundo dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento e disponibilizados pelo Conselho Nacional de Justiça. De acordo com o artigo 134 do Código Penal, o responsável por abandonar uma criança pode receber uma pena de detenção de 6 meses a 3 anos.
Mas, é difícil encontrar o responsável, porque abandono é crime. Se todas as mães soubessem que estão amparadas pela lei para entregar a criança às Varas da Infância, isso não aconteceria, asseguram os conselhos tutelares.
De 2015 a julho de 2021, 18,7 mil crianças e adolescentes entre zero e 18 anos deram entrada em serviços de acolhimento com o motivo “abandono pelos pais ou responsáveis”. Ao todo, o país tem, hoje, 29,2 mil crianças e adolescentes em 4.594 locais diferentes.
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Os números, infelizmente, representam uma dura realidade vivenciada no País. Não é diferente em Anápolis, onde, também, há muitos casos de abandono de crianças e adolescentes, por razões diversas.
Segundo o juiz da Infância e Juventude, Carlos Limongi Sterse, hoje, cerca de 40 a 45 crianças estão em situação de acolhimento no Município, em três instituições: Instituto Luz de Jesus, Instituto Cristão Evangélico e Projeto Amando.
O magistrado relata que boa parte das crianças e adolescentes vão parar nesses locais por conta de situações como violência (sexual, ou não), maus tratos e, principalmente, a dependência dos pais com as drogas.
Aliás, drogas e violência são duas coisas que caminham juntas, formando um coquetel perigoso dentro de um ambiente familiar desestruturado.
Ainda assim, pondera Carlos Limongi, todo processo para o encaminhamento de crianças e adolescentes para acolhimento é feito com muito critério. E isso ocorre quando não há como as mesmas ficarem com a chamada “família extensa” (avós, tios, primos, dentre outros), por alguma razão.
O juiz da Infância e Juventude ressalta que nestes casos de abandono, é preciso agir e buscar soluções rápidas. E, dentro desse processo, é necessário fazer uma verificação da condição da criança e da família. No geral, as audiências de verificação ocorrem até 30 dias. Em muitos casos, consegue que a criança e o adolescente fiquem com a família extensa.
Porém, em alguns casos isso não é possível e bem a volta para a família e, daí, já se passa a um outro processo que é o encaminhamento para adoção.
Projeto piloto
Anápolis, de acordo com o juiz Carlos Limongi Sterse, pode avançar nessa questão do acolhimento, através de um projeto que está sendo trabalhado pela Prefeitura, via secretaria de Desenvolvimento Social e a Vara da Infância e Juventude. Pode ser que esta iniciativa seja uma espécie de projeto piloto para Goiás.
A ideia é trabalhar com o acolhimento familiar. Algumas iniciativas nesse sentido já estão mais desenvolvidas em outros estados das regiões Sul e Sudeste- destaca Carlos Limongi. E, conforme observa, esse tipo de acolhimento é uma tendência no Brasil.
O acolhimento familiar- explica o juiz- é diferente da adoção, porque tem um caráter temporário. A família que se cadastrar deve estar ciente de que a criança e os adolescente vai voltar à família de origem.
Por isso, é um procedimento que deve estar bem amarrado, amadurecido e concebido. Dessa forma, não é um projeto que vai nascer do dia para a noite, devido a sua complexidade. Aliás, o abandono em si já é uma questão complexa, que envolve muitas facetas: econômicas, sociais, religiosas e de diversas outras naturezas.
O juiz destaca também que em Anápolis, não tem ocorrido o surgimento de crianças órfãs da Covid-19, ou seja, que ficaram em situação de abandono em decorrente da morte dos pais.
Redução
A pandemia da covid 19 reduziu o acolhimento, mas, isso não é boa notícia. Pelos dados do CNJ, percebe-se uma redução de cerca de 15% de acolhimento de crianças abandonadas entre 2019 e 2020, ano em que o mundo foi atingido pela pandemia da covid-19. Mas, essa diminuição não aconteceu porque as crianças passaram a ser bem cuidadas. As escolas são parceiras para descobrir violação de direitos humanos e o afastamento de crianças desses ambientes tirou essa fonte importante de fiscalização. Com o retorno gradativo, já se recebem novas denúncias. E, se uma pessoa tem notícia de algum fato que coloque alguma criança em risco, deve denunciar à Vara da Infância, ao Ministério Público ou ao Conselho Tutelar que atua na região. É possível também fazer uma denúncia anônima, pelo telefone 180, do Governo Federal.
Sobre o Acolhimento
O acolhimento de uma criança ou adolescente é determinado pela Vara da Infância e da Juventude e solicitado pelo Conselho Tutelar em ocasiões como abandono, morte dos pais, violência, situação de rua, entre outros cenários que colocam essas pessoas em perigo. Toda vez que um menor é retirado de onde vive e colocado em um serviço de acolhimento, é preciso preencher uma guia com dados como o motivo da institucionalização. Porém, quando não se sabe o motivo ou a razão do acolhimento, utilizam-se com mais frequência os termos negligência e abandono.
Quando se fala em acolhimento, fala-se de crianças pobres. Às vezes, os pais deixam em hospitais crianças que têm graves problemas de saúde. Além desses, outros principais motivos que levam uma criança ao acolhimento são a negligência, a violência e a perda de capacidade dos responsáveis de cuidar, por uso de substâncias psicoativas por exemplo. Todavia, o que mais leva ao acolhimento, em geral, é a falta de políticas públicas na área social. Pela lei, a criança é acolhida em situação de risco como fome, ou quando o responsável está em situação de droga. Mas, em famílias ricas, também, acontece o abandono. Quase sempre, de cunho afetivo, questões que vão parar nos divãs terapêuticos.
O Estatuto da Criança e do Adolescente determina que o acolhimento institucional seja uma medida protetiva excepcional e provisória. A partir do momento em que a criança e o adolescente são acolhidos, a prioridade é que eles retornem para o seu lar, ou morem com quem tenham algum vínculo.
A busca por essa chamada família extensa deve ser feita num prazo máximo de 90 dias. Esgotadas essas possibilidades, e percebendo que não há condições para que essa pessoa acolhida retorne para sua casa, ela entra na fila de adoção, tema abordado na segunda reportagem dessa série sobre abandono, acolhimento e adoção. (Com informações do Universa UOL)