Danilo Baliza
Se você acha que o preço dos combustíveis é excessivamente alto este texto é para você. Se acha que o revendedor do combustível é o grande anti-herói deste setor do mercado de consumo, esse texto é primordial a você.
Que há uma oneração em excesso do combustível, não há dúvidas. Apenas em 2021 o preçoda gasolina subiu nas refinarias 54% e do diesel 41%, respectivamente.
Ainda que você não dependa diretamente deste produto para sua atividade profissional, o aumento reflete no bolso de qualquer cidadão. Isso porque o combustível é agregador de custo de qualquer produto ou serviço, já que estes dependem do transporte em todas as fases do processo de produção.
Veja um exemplo direto: ao pedir comida por um aplicativo, você arca diretamente com o custo da entrega. Ele, por óbvio, é maior ou menor a depender da distância do remetente. Significa que o preço do custo da entrega, leia-se, combustível gasto, é repassado ao consumidor final. Mas disso se sabe.
Lado outro, veja um exemplo indireto. O custo do combustível está inserido no mesmo alimento entregue ao consumidor, seja ele qual for. Isso porque, a matéria-prima utilizada para a fabricação veio de uma indústria ou de um produtor local e o preço pago pelo insumo contém o custo do transporte até o fornecedor, que por sua vez agregou outros custos indiretos e margem de lucro no produto. É economia básica.
Gostando ou não, esse é o mercado de consumo, submetido ao crivo da Constituição e do Código de Defesa do Consumidor, baseado no sistema capitalista, onde o custo de produção inserido no produto, antes de chegar ao consumidor final. De novo, é economia básica, que deveria preencher uma disciplina obrigatória no ensino fundamental.
No Brasil, falando sobre combustíveis, a Petrobras domina o mercado e, por consequência, gera influência direta no preço da gasolina e do diesel, com impacto de empresas privadas. O diesel sofre influência ainda maior em decorrência do peso do petróleo na composição deste combustível. Há ainda o ICMS, PIS/Pasep, COFINS e Cide, a influência sobre os lucros do produtor ou importador, custo do etanol anidro (incluído na composição da gasolina) e do biodiesel (no caso do diesel), para, apenas depois disso, vir a margem de lucro do revendedor final (postos).
Não há como tecer uma discussão sobre o mercado de combustíveis, sem que haja uma correta compreensão sobre a formação do preço, pois essa ressignificação (palavra da moda) desconstitui inverdades, objetivo primário deste texto, sobretudo de que o revendedor de combustíveis, aquela última figura ante do consumidor final, é o grande vilão do cenário da majoração dos preços. Assim como no alimento consumido, aquele do exemplo, o preço do combustível é formado por custos diretos1 , ou seja, o valor gasto para adquirir-se a matéria-prima da sua atividade econômica. Em linhas gerais, é o quantum pago pelo revendedor (posto) pelo combustível ao distribuidor. No ensejo de ser prático, veja um exemplo hipotético: um Posto revendeu hoje o seu combustível (etanol) ao consumidor final por R$ 3,19 o litro. O consumidor final tem todo o direito de, numa análise superficial, considerar o preço alto, mas de atribuir uma conduta de abusividade ao revendedor, nem mesmo uma instituição protecionista, tais como PROCON ou Ministério Público.
Afirma-se isso porque, no caso hipotético, o revendedor adquiriu o produto direto dadistribuidora por R$ 2,89. Significa que, no exemplo hipotético, haveria uma suposta margem de lucro deR$ 0,30 centavos por litro. Essa fixação do preço configura ato ilícito, que implique em descumprimentoao determinado pelo artigo 39, alínea X do CDC (já falaremos sobre ele)? Essa é a provocação.
Os valores acima transcritos hipoteticamente se referem apenas ao custo principal do produto, sem mencionar despesas indiretas da atividade econômica. Em linhas objetivas, o revendedor imaginário do exemplo não auferiu lucro de R$ 0,30 centavos por litro, pois os custos indiretos da atividade econômica não foram computados. Deseja saber quais são?
São custos indiretos os pagamentos de despesas ordinárias, tais como salários, FGTS, INSS, Tributos Federais, Tributos Estaduais, Tributos Municipais (IPTU, TSU), Energia Elétrica, Saneamento básico, Água, Royalties (Postos Bandeirados), Licenças Ambientais, Corpo de Bombeiros, Alvará de Funcionamento, Segurança do Trabalho, Equipamentos de Proteção Individual (EPI), Equipamentos de Proteção Coletiva (EPC), Despesas Administrativas, Bancárias e de manutenção, sem mencionar-se as despesas extraordinárias e imprevisíveis.
Não há como o Poder Público fiscalizador supor que houve fixação abusiva do preço do produto pelo revendedor. Suposição é para o consumidor (o que é aceitável). Essa conclusão equivocada decorre minimamente da falta de conhecimento real de uma atividade comercial e empreendedora, onde figura-se a máxima de que as Receitas devem ser superiores às Despesas, sob pena de ter-se uma atividade inviável.
Falando sobre (i)legalidade, o artigo 39, inciso X, do CDC, veda-se a fixação excessiva ou elevação de preços sem justa causa. Sua aplicação permite a proteção do consumidor da prática de preços elevados. Entretanto, é preciso avaliar o conceito jurídico de ‘prática abusiva’ antes de atribuir-se a qualquer atividade tal característica reprovável.
O conceito inibido pelo CDC é aquela conduta do fornecedor que viola o equilíbrio e boa-fé objetiva que devem prevalecer nas relações de consumo. Em linhas diretas, não é qualquer fixação de preço que pode ser taxada como abusiva.
No regime constitucional da livre iniciativa, fundada na propriedade privada, os detentores dos meios de produção têm liberdade de fixar livremente os preços. Explica-se: A própria Constituição Federal prevê um regime de controle dos preços cobrados por bens e serviços, na medida em que determina a edição de lei que combata o aumento arbitrário de lucros, mas essa é a exceção. A palavra arbitrário tem o mesmo sentido de ausência de justa causa, prevista na norma consumerista. Dessa forma a intervenção do Estado na economia somente é admitida quando for demonstrada haver uma causa, uma justificativa.
É preciso reafirmar uma economia de livre de intervenções de preço de mercado. O fato de a ordem econômica ter por princípio a proteção do consumidor não exige, por si só, o controle de preços. O fundamento constitucional para o controle de preços é a vedação do aumento arbitrário de lucros e apenas quando há arbitrariedade. Repita-se, apenas quando há arbitrariedade.
Significa que os custus legis (fiscais da lei) não deve direcionar seu apontamento acusador cheio de suposições a quem não pode solucionar a controvérsia do elevado preço do combustível, o revendedor final. A redução dos preços dos combustíveis é necessária, mas o diálogo é sistêmico e devem envolver todos aqueles que contribuem para o aumento de preços, inclusive os arrecadadores de tributos.