O Estado existe, em tese, para a consecução do bem comum à sociedade. E, para atingir tal objetivo, precisa obter recursos financeiros, o que faz, basicamente, de duas formas: originariamente, por meio de receitas patrimoniais ou empresariais, similar a um particular; e/ou, de maneira derivada, através de tributos, multas e reparações de guerra.
No que tange à forma de arrecadação derivada, mais especificamente quanto à cobrança de impostos, uma das técnicas utilizadas pelo Estado para a tributação é quanto à capacidade contributiva de cada pessoa, seguindo critérios de seletividade; isto é, sua força econômica e seu potencial arrecadatório são graduados conforme a relevância social do produto ou do serviço a ser tributado.
Isso significa que quanto mais essencial e necessário a mercadoria for à subsistência das pessoas, nas comunidades e na manutenção das condições de vida atualmente conhecidas, menor a quantidade de imposto a ser pago sobre o referido bem. De igual modo, quanto mais irrelevante e supérfluo for o item, maior será a tributação incidente.
Sob esse entendimento, o legislador constitucional previu que o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços, tal como dita o artigo 155, III, §2º da CF. Assim, na teoria, o texto constitucional criou a faculdade de o legislador ordinário estabelecer a seletividade quanto à cobrança do referido imposto.
Contudo, na prática, como conseqüência dessa discricionariedade e em nome de uma política tributária assentada no critério da arrecadação mais rendosa e a custo zero, insusceptível de sonegação, o Estado acabou por sobrecarregar grandiosa e gravosamente o consumo de energia elétrica, atribuindo alíquotas exorbitantes a um produto que é sabidamente indispensável à vida humana.
Afinal, nos dias atuais, a energia elétrica se tornou um bem verdadeiramente essencial à sociedade como um todo, de modo que sua existência está íntima e efetivamente ligada à manutenção de uma vida minimamente digna. Afinal, é sabido que as necessidades mais básicas dependem de energia, desde produzir luz e refrigerar os alimentos, até mesmo ligar um mero computador, sendo diretamente imprescindível para o funcionamento de qualquer residência ou estabelecimento empresarial.
Em razão de tal disparidade, o Supremo Tribunal Federal está analisando, em caráter de Repercussão Geral, o Recurso Extraordinário nº 714.139, que permeia a quase 10 anos, visando estabelecer o caráter seletivo do ICMS sobre a energia elétrica, de modo a diminuir substancialmente as alíquotas incidentes sobre o referido produto. Entretanto, pode-se dizer que já há contagem regressiva no que pertine a essa questão ser resolvida.
Posto que, recentemente, o Relator do aludido processo, o ministro Marco Aurélio, proferiu voto favorável aos contribuintes, no sentido de reconhecer a seletividade do ICMS sobre a energia elétrica, sob a justificativa de que, no estágio atual da civilização, a energia elétrica é sempre um bem essencial, de forma que sua ausência acarretaria a paralisação do processo produtivo e nem haveria circulação de riquezas.
No caso, ainda resta aos demais ministros (julgadores) decidirem em definitivo sobre a inconstitucionalidade dessa tributação que atenta contra o princípio da razoabilidade, porquanto, a energia elétrica é a força motriz que gera o desenvolvimento econômico-social; e, à população cabe acompanhar atentamente o referido feito, em vista de que a vitória pró-contribuinte pode acarretar em uma patente e justa diminuição na conta de energia elétrica mensal.