Por precaução, muitas relatam que não veem a família desde o início da pandemia. Sexo feminino lidera a mão de obra do setor
O coronavírus tem afligido homens e mulheres de maneira diferente. Embora a doença pareça causar um pouco mais de complicações no sexo masculino, suas consequências para a sociedade e, principalmente, a quarentena, afetaram, sobretudo, a ala feminina.
Segundo dados divulgados pelo próprio Ministério da Saúde, 70% da mão de obra do setor é composta por mulheres. Ou seja, elas são a maioria na linha de frente contra a Covid-19. Tendo isso em vista, o Portal CONTEXTO foi em busca dessas profissionais para conhecer cada história por trás das máscaras e equipamentos hospitalares.
O rosto da luta
A enfermeira Érica Chaves, atual responsável pelo pronto atendimento do Ânima Centro Hospitalar, conta que precisou se ressignificar todos os dias. Encontrar pacientes vulneráveis, lidar com a perda e o medo são parte da rotina diária ao longo deste ano de pandemia.
Os pesadelos e problemas para dormir se tornaram constantes, além da tristeza de um cenário difícil. “É angustiante, nos colocamos no lugar dos pacientes e familiares, um sentimento de fraqueza e medo. Lidar com tudo isso traz uma sobrecarga emocional e um sentimento de estarmos todos vulneráveis”, conta.
Ravyla Gomes, trabalhadora de uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), explica que grande parte dos familiares são trabalhadores da saúde. De modo, que o medo e a solidão se tornaram constantes. “Literalmente ficamos separados em casa. Só nos reunimos poucas vezes nas refeições. Eu me comprometi a cumprir a missão até o fim e tento viver apenas o hoje”, completa.
A rotina após o expediente também mudou. Se antes elas tinham um momento de lazer, ou prática de esportes, esses momentos precisaram ser interrompidos, ou adaptados.
Neste momento, toda atenção é pouca. As roupas e calçados são descartados em um cesto antes mesmo de entrarem em casa. “Chego no portão, tiro os sapatos e coloco todos em uma sacola. Retiro minha roupa na área de serviço e as coloco em um balde com álcool. Depois de tudo isso, corro para o banheiro, tomo banho e, posteriormente, ao invés de cremes, estou usando álcool em gel nos braços e mãos”, explica Gomes.
Solidão
A saudade da família e das pessoas queridas aumentou sem os abraços, conversas e sorrisos. Houve quem precisou se afastar de pais, filhos, irmãos, parentes e amigos. “Hoje voltamos para casa com medo, medo de adquirir o vírus e transmitir para o nosso lar. Foi preciso me afastar da minha mãe, que antes da pandemia nos víamos quase todos os dias”, desabafa Erica.
Mas, nem só de tristezas vivem as trabalhadoras da saúde, as altas dos colegas de profissão e a centenas de vidas salvas, logicamente, são motivos para comemorar, agradecer e não desistir da luta.
A saúde integral da mulher
Se para algumas trabalhadoras o serviço só aumenta, por outro lado, não menos importante, a rotina deu uma diminuída considerável.
Conforme explica a ginecologista, Dra. Lorena Lourenço, a queda no acompanhamento de rotina foi perceptível nesse período. “Com o adiamento destes exames de rotina, a mulher perdeu a oportunidade de fazer o diagnóstico precoce de várias doenças, que quando descobertas e tratadas no início têm altas taxas de cura”, aponta.
Como prova deste adiamento, um levantamento feito pela Fundação do Câncer, revelou uma queda de 84% no número de mamografias feitas no Brasil durante a pandemia do novo coronavírus, fator que pode afetar o prognóstico e as chances de cura da doença.
Segundo a especialista, o grupo mais afetado foi o de mulheres acima dos 60 anos, bem como grávidas e puérperas, que ficaram com medo da realização do acompanhamento médico. “Tive pacientes que cogitaram até mesmo parto domiciliar pelo medo da contaminação, o que é desaconselhado em muitos casos”, relata Dra. Lorena.