Comércio entre os moradores nasceu como uma saída na geração de renda depois da pandemia
José não costuma acompanhar a programação do condomínio onde mora, no bairro Chacaras Colorado, região Norte de Anápolis. A rotina de trabalho é pesada. Mas ao chegar em casa no fim da tarde de uma quinta-feira, deu de cara com o resultado de uma decisão tomada na última assembleia de moradores. Uma feira livre, estilo essas em que a gente come pastel frito e compra verduras frescas. Ele não teve dúvidas. Chamou a mulher e desceu para a área comum para aproveitar a novidade. Respirou ar puro, conheceu gente nova, comeu o tal pastel e umas pamonhas fritas que tinha lá e ainda levou embora verduras, um pote de mel puro e uma linguiça caseira pra fazer no almoço do dia seguinte.
Esse relato é verídico. O José mora no residencial Royal Garden. Um complexo de 520 apartamentos onde vivem cerca de 1 mil pessoas e que há um ano recebe um grupo de feirantes toda quinta feira a partir das 17 horas. A ideia partiu de outro morador, que já era feirante e viu sua renda despencar com a chegada da pandemia. Ele procurou o síndico, que gostou da proposta e levou para a assembleia aprovar. O síndico é o Paulo Francisco Alves, que também é Bombeiro Militar. A propósito, esse é o 4° mandato dele e a implantação da feira foi um dos projetos que garantiram mais uma reeleição. “Nunca ouvi qualquer reclamação sobre ela. Pelo contrário. Os moradores adoram a programação das quintas”, diz ele.
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Segundo Paulo, quando a ideia chegou aqui já havia outros condomínios experimentando o modelo com sucesso. “Não vimos nenhum ponto negativo na feira. Só positivos. Garante a renda de quem está apertado ou desempregado, promove integração entre os condôminos, tem verduras frescas toda semana e ainda é um lazer para toda a família”, explica o síndico. Recentemente, no mês de junho, a feira teve tema de festa junina, com direito até a fogueira. Outra novidade foi a música ao vivo. “A participação dos moradores é maciça e o ambiente é melhor que muito barzinho por aí, com a vantagem da segurança”, detalha Janaína, uma das moradoras.
Renda extra
Diego Rodrigues administra dois condomínios. Um, também nas Chácaras Colorado, com 432 apartamentos e cerca de 1,2 mil moradores e outro na Cidade Jardim, com 220 unidades e quase 600 condôminos. Nos dois a ideia da feira pegou forte. Foi logo depois do primeiro lockdown, em 2020. Segundo ele, na época, a Inadimplência nos dois residenciais bateu em 25%. “Resolvemos implantar a feira para melhorar a renda dos moradores. Deu tão certo que hoje a Inadimplência é de 4%”, revela Diego. Mauro é um dos feirantes. Ele é promotor de eventos e não arrumou mais trabalho desde que a Covid-19 apareceu a Anápolis. Chegou a ter cinco condomínios atrasados e pensou em vender o apartamento para continuar vivendo. A feira veio como uma salvação. “Comecei fritando pastel, depois vieram a pamonha, os refrigerantes e os hambúrgueres gourmet. Não tenho o mesmo padrão de vida e há muita coisa atrasada ainda, mas tenho conseguido me segurar”, afirma ele, que conta com a ajuda das duas filhas e da mulher.
A tendência é de expansão. Paulo pensa até em cadastrar os feirantes na prefeitura, que pode oferecer cursos de capacitação e profissionalização, aumentando a qualidade dos serviços. Mas para quem quer levar a ideia para outros condomínios é muito fácil. Diego explica que esse tipo de residencial é regido pelo Direito Privado, onde o que não é proibido e permitido. “O administrador precisa apenas ter atenção às necessidades e vontade dos proprietários, estendendo as regras de convivência à área da feira”, diz ele. Sem taxas de participação ou aluguel de ponto, os feirantes conseguem baixar os preços e fidelizar clientes mais rapidamente. “Todos ganham e, até agora tivemos zero problemas”, conclui Diego.