Os comerciantes do Mercado Municipal “Carlos de Pina” estão em conflito. O motivo é um projeto que prevê uma grande reforma apresentado, pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, aos 98 permissionários que têm boxes no local, durante uma reunião que aconteceu no início deste mês. Uma votação, realizada na ocasião, revelou que 57% deles são a favor, deixando os restantes bastante descontentes. A polêmica não se dá pelo fato da reforma em si, que todos desejam de alguma forma, mas pelo projeto apresentado que traz mudanças nas dimensões e localizações dos boxes com o propósito de padronizá-los.
Para estudar a reforma do Mercado a Secretaria de Desenvolvimento Econômico contratou profissionais das áreas da arquitetura e engenharia. O projeto apresentado por eles tem características bem diferentes do que é visto no local. Hoje, as lojas estão em ordem aleatória e um dos objetivos seria organizá-las em setores de açougues; verduras; roupas, calçados e uma praça de alimentação centralizada. Os açougues ganhariam sala de desossa e as bancas de verdura teriam uma sala para se lavarem os produtos. Além disso, a proposta, também, é trocar toda a rede de esgoto e fazer novos banheiros, inclusive com acesso facilitado para portadores de necessidades especiais e fraldário. No entanto, alguns comerciantes desejam que, apenas, a parte da rede de esgoto, e dos sanitários, passe por transformações.
Dificuldades
Outros dois problemas, também, discutidos, são o fato de que o Mercado Municipal é tombado pelo Patrimônio Histórico da Cidade, de forma que, qualquer mudança deve ser feita respeitando os aspectos originais do mesmo e que, para reformar seria necessário fechar o Mercado por um período estimado de oito meses.
De acordo com o secretário Air Ganzarolli, ambas as questões foram pensadas. Ele explica que existe uma parte específica que foi tombada e que suas características seriam mantidas como, por exemplo, as entradas principais. E, que, para iniciar as obras, a Secretaria deverá encontrar uma área próxima do Mercado onde seriam colocados os permissionários, até toda a reforma se concluir.
“A reforma não é uma imposição”, garantiu o Secretário. Ainda, segundo ele, não há como arrumar, apenas, os sanitários e tubulações com os comerciantes no interior do Mercado Municipal. “Quando começar a retirada da tubulação antiga, ninguém aguentará ficar lá dentro. O odor vai exalar por toda parte. É impossível reformar sem removê-los”, concluiu.
Opiniões
A maioria dos votos favorece a reforma. Esses comerciantes reclamam de vários problemas que tornam trabalhar no Mercado Municipal uma tarefa difícil. Dentre eles, o calor; mau cheiro, sanitários antigos e desorganização. Com as mudanças, eles acreditam que o Mercado Municipal passaria a ser um atrativo para mais pessoas que hoje não frequentam o local por esses motivos.
A banquinha de roupas está na família de Francisco de Assis Barbosa há 54 anos. Para sua filha Rosângela Barbosa, a reforma já deveria ter sido feita e as pessoas que votaram contra são, na maioria, aquelas que já reformaram seus boxes. “Fomos informados pela Prefeitura que ninguém deveria fazer reforma nas lojas porque eles iam fazer. Agora, essas pessoas que reformaram tudo estão com medo de perder o que investiram, mas foi avisado a todos aqui”, garantiu.
Suzana Maria da Costa Neves trabalha com vestuário no Mercado Municipal há 38 anos. Ela entende que o projeto da reforma é mais do que esperavam. “Não temos um telhado, banheiros e rede de esgoto decentes aqui. Fica difícil trabalhar assim. Tem dia que fecho a loja mais cedo porque é impossível ficar aqui com tanto mau cheiro. Mais cedo, ou mais tarde, esse esgoto vai estourar e vamos ter que sair daqui de qualquer jeito. É uma questão de saúde pública já”, falou.
A banca de Shirley Maria Soares de Oliveira já funciona há 58 anos. Hoje ela ocupa o lugar dos pais, já muito idosos para trabalhar. Segundo ela, o projeto da reforma é muito bom. “Sempre quisemos essa organização com todos os setores separadinhos. Lógico que vou deixar, com saudade, minha loja. Mas não quer dizer que não posso me abrir ao novo”, explicou.
Do outro lado, muitos comerciantes não querem a reforma do jeito que foi apresentada no Projeto. Eles querem que a Prefeitura reforme, apenas, os sanitários e a rede de esgoto. Além disso, também, não concordam em deixar o Mercado Municipal durante o período de obras. Eles temem, principalmente, que suas clientelas encontrem outros locais para comprar e não voltem depois.
Os mais antigos comerciantes do mercado são Manoel e Maria Avelino da Silva. Estão lá desde 1951, quando o Mercado Municipal foi inaugurado. O maior temor dos dois é que não consigam voltar nunca mais para lá após a reforma. “Isso aqui é nossa vida. Não vamos sair daqui de forma alguma. Só pedimos para reformar os sanitários e a rede de esgoto, só isso. Se nos tirarem daqui, quem garante que vamos conseguir voltar?”, questionou Maria.
Também há muito tempo no Mercado está Joaquim Nonato. Desde 1952. Ele, também, não gostou da proposta da reforma e tem os mesmos temores que seus amigos Manoel e Maria. “Não queremos que ninguém mexa nas nossas lojinhas. Gostamos assim”, disse.
A proprietária de um açougue, Adriana Garcia de Mauro, está muito preocupada com a proposta de reforma que viu. “Eles vão modificar tudo. Vão me tirar de um espaço de 30 metros e me colocar em um de 16 metros. Vão de tirar de um lado e colocar do outro. Queremos que reformem o que é preciso. Se eu fechar, meus clientes vão ficar soltos e pode ser que não voltem quando eu reabrir. Assim do jeito que eles querem não vai dar certo, vai prejudicar muita gente aqui”, desabafou.
Ministério Público
Um dos comerciantes que é contra a reforma do Mercado Municipal, Edgar Bueno, tomou frente a uma comissão que levou o caso ao Ministério Público. Ele trabalha no local desde os 15 anos de idade e há 29 anos tem sua própria loja de calçados.
Edgar procurou o Ministério Público devido à sua preocupação com as mudanças propostas pelo Projeto para a reforma do Mercado Municipal. Ele diz que se trata de um patrimônio histórico que não pode sofrer grandes alterações. “Para início de conversa, esse termo “reforma” nem pode ser utilizado. O Mercado Municipal só pode passar por revitalização. Esse mercado sustentou Brasília durante sua construção e agora eles vêm com um Projeto que vai transformá-lo em Shopping Center. Acredito que o Ministério Público não vai permitir isso”, falou.
De acordo com a Promotora de Justiça, Sandra Mara Garbelini, que recebeu a denúncia, já foi instaurada uma investigação pelo Ministério Público. Ela ressalva que todo o Mercado Municipal é patrimônio histórico, tombado por lei municipal em 10 de julho de 1984, e não apenas algumas partes. De forma que, qualquer obra realizada no local deve manter sua originalidade. “Já enviamos ofício ao Procurador do Município pedindo cópia do projeto de reforma para verificarmos se há irregularidades”, garantiu.