Diminuição na diferença de preços provocou queda considerável no consumo do cigarro do crime e consequente migração do consumidor para o produto legal
Nova pesquisa do Ibope Inteligência/Ipec aponta que, em 2020, ano marcado pelo enfrentamento da pandemia da COVID-19, a ilegalidade respondeu por 49% de todos os cigarros consumidos no Brasil, sendo que 38% foram contrabandeados principalmente do Paraguai e 11% foram produzidos no Brasil, por fabricantes classificados como devedores contumazes, que fazem do não pagamento de impostos o seu negócio.
Com isso, 53,9 bilhões de cigarros ilegais inundaram as cidades brasileiras no último ano. A pesquisa foi divulgada pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO).
O cenário da pandemia mundial provocou uma alta inédita no dólar que elevou o preço do produto ilegal. Com a cotação da moeda norte-americana ultrapassando a marca de R$ 5, o custo médio do cigarro do crime passou de R$ 3,44, em 2019, para R$ 4,44, em 2020, aproximando, assim, o produto do crime do cigarro legal – que, no Brasil, tem o preço mínimo definido por lei no valor de R$ 5.
Essa diminuição na diferença de preços provocou, pela primeira vez nos últimos dez anos, uma queda considerável no consumo do cigarro ilícito e consequente migração do consumidor para o cigarro legal, produzido nacionalmente, sob as normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
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Segundo Edson Vismona, presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), os resultados do levantamento em 2020 mostram que é possível para o Brasil combater a ilegalidade no setor de cigarros, substituindo o ilícito pelo produto legal.
“A pandemia alterou fatores econômicos que impactaram também o negócio do crime organizado. Isso mostra que se mexermos nas variáveis econômicas de modo a atacar de frente o produto ilegal, o mercado legal nacional tem toda a capacidade de assumir essa parcela, gerando emprego e arrecadação, sem resultar em aumento de consumo”, aponta Vismona.
Em 2019, o mercado ilegal de cigarros alcançou 57% de participação – o patamar mais alto. Em 2020, esse número reduziu 8 pontos percentuais. Além da alta do dólar, o recuo incomum na economia ilegal observado no último ano também é resultado de uma combinação atípica e circunstancial que envolveu ainda: medidas de isolamento social no Brasil e no Paraguai em decorrência da pandemia, o fechamento parcial de fronteiras no Brasil, o fechamento temporário de fábricas de cigarros no Paraguai, além do aumento nas apreensões.
Já o mercado legal, que em 2019 alcançava 43% de participação, em 2020 aumentou os mesmos 8 pontos percentuais, chegando a 51% de participação. Essa inversão contribuiu para um incremento de R$ 1,7 bi na arrecadação tributária do Brasil sobre o setor do tabaco, alcançando R$ 13.5 bilhões arrecadados.
Sonegação alta
Mas a sonegação causada pela ilegalidade ainda é alta: R$ 10.4 bilhões. Esse valor, se revertido em benefícios para a população, poderia ser usado para a construção de 94 mil unidades de casas populares, ou 18 mil Unidades Básicas de Saúde (UBS), ou ainda 58 mil leitos de UTI para o tratamento de COVID-19. Além dos impactos econômicos, o cigarro ilegal está associado ao financiamento de organizações criminosas e milícias.
Para Edson Vismona, apesar da diminuição da participação do mercado ilegal no último ano, o resultado não pode ser considerado positivo. “Esta queda é reflexo de um cenário atípico e circunstancial e, sem estratégias de longo prazo, o mercado ilegal voltará a crescer”, afirma. Para isso, a questão tributária é fundamental e deve ser colocada em discussão”, acredita. No Brasil, os impostos sobre os cigarros variam de 70% a 90%, dependendo do Estado. Já no Paraguai, o produto é taxado em apenas 18%.
Realizada desde 2014, a pesquisa Ibope tem abrangência nacional e, nesta edição, foi a campo entre outubro de 2020 e janeiro de 2021. Foram realizadas entrevistas presenciais com 9 mil fumantes com idades de 18 a 64 anos, residentes em municípios com 20 mil habitantes ou mais.