Instituída, principalmente, a partir do clamor popular, A Lei Maria da Penha está contribuindo para mudar a realidade no Brasil, no que diz respeito à violência praticada contra a mulher. Essa constatação é do ‘Mutirão da Penha‘, formado por parlamentares que têm percorrido algumas regiões do País colhendo informações acerca da aplicabilidade da lei.
“A lei foi um grande avanço, mas ainda falta estrutura para atender à demanda de assistência”, avalia a deputada Flávia Morais (PDT-GO), que participou do Mutirão da Penha em São Paulo e em Goiás. Em São Paulo, segundo ela, não existe uma secretaria estadual de políticas para as mulheres, órgão que seria responsável pela articulação de todas as ações no setor. Já em Goiás, a secretaria existe, mas faltam delegacias e juizados especializados no assunto.
A parlamentar argumenta que existem muitos projetos em andamento, mas implantados de forma isolada, sem integração. O resultado é que, às vezes, o Ministério Público tem um núcleo de combate à violência doméstica, mas o estado não constrói casas-abrigo. “A lei também fala em juizados contra a violência, mas não só eles são importantes. O agressor, por exemplo, precisa de tratamento para não fazer mais vítimas”, observa a deputada goiana.
A deputada Elcione Barbalho (PMDB-PA), responsável pela organização do Mutirão da Penha, ressalta a importância de ações articuladas no combate à violência contra a mulher. Ela explica que o trabalho da Procuradoria, restrito à Câmara, seria insuficiente para consolidar as ações necessárias para a aplicação efetiva da lei. “Desta forma, surgiu a ideia de percorrer os estados”, afirma, ressaltando os resultados positivos desta fase inicial das visitas.
“Nos estados, as autoridades locais querem alguém que movimente e ajude na articulação. É uma forma de chamar a atenção da mídia e dos gestores para a causa”, complementa Flávia Morais. Ela acredita que novos avanços, no entanto, dependem de mais orçamento e da eleição de mais mulheres para o Parlamento.
Além de São Paulo e de Goiás, o Mutirão da Penha visitou, em 2011, o Pará e o Distrito Federal. Em cada unidade da Federação, as deputadas reúnem-se com representantes do governo local, dos tribunais de Justiça, do Ministério Público e das assembleias legislativas.
Atendimentos
Dados da Secretaria de Políticas para as Mulheres mostram que o número de solicitações cresceu desde a entrada em vigor da lei. Em 2007, quando o sistema foi adaptado para receber informações sobre a Lei Maria da Penha, a Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180) registrou 438.587 atendimentos. Entre janeiro e outubro do ano passado (últimos dados disponíveis), o sistema já havia recebido 530.542 ligações.
O número de serviços especializados na assistência à mulher, como delegacias e juizados, também aumentou. No ano passado, o País contava com 928 serviços, contra os 521 existentes em 2006 – um crescimento de 78,1%.
Medidas judiciais
Balanço parcial do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) do ano passado mostra que, em quatro anos, 9.715 pessoas foram presas em flagrante com base na Lei Maria da Penha. O balanço considerou processos distribuídos em varas e juizados especializados no tema desde a entrada em vigor da lei (agosto de 2006) até julho de 2010.
No período, foram decretadas 1.577 prisões preventivas e gerados 331.796 processos envolvendo a lei. Cerca de 1/3 (111 mil) deles resultou em decisão judicial. Foram tomadas pela Justiça mais de 70 mil medidas de proteção à mulher.
O impacto da lei no dia-a-dia das mulheres também é considerado positivo. Sondagem de opinião realizada pela Câmara no ano passado constatou que a Lei Maria da Penha é aprovada por 95,5% dos entrevistados.
Anápolis tem número crescente de atendimento
Em Anápolis, a Delegacia da Mulher prestou, em 2011, 2.900 atendimentos, dos quais, 1.762 resultaram em Boletins de Ocorrência e outros processos formalizados. No ano de 2010, esse número foi de 1.108. Um crescimento acentuado, segundo a avaliação da titular da especializada, Aline Soares Ribeiro Vilela, mas que representa essa nova realidade trazida pela Lei Maria da Penha para a sociedade, que é a maior pré-disposição das mulheres em denunciar os abusos e a violência que são vítimas.
Dos atendimentos realizados no ano passado, de acordo com a Delegada, 127 resultaram em prisões em flagrante e o consequente enquadramento na Lei Maria da Penha. Dentre os casos registrados estão tentativas de homicídio, lesões graves e a maioria é tipificada como crimes contra a honra. Neste ano, até o último dia 20, já são 243 atendimentos registrados, com uma tentativa de homicídio e um caso de vítima com lesão grave.
Segundo a Delegada Aline Vilela, a Lei Maria da Penha tem um apelo tão forte que houve casos, no ano passado, de tentativa de uso da polícia para incriminar pessoas inocentes. Num dos casos – relata – uma mulher “forasteira” acusava três rapazes por prática de estupro. Mas a denunciante não conseguiu enganar a Polícia. “Então, temos até casos como este, em que a mulher entra aqui na delegacia como denunciante e sai como acusada”, narra. Este, no entanto, é um caso atípico. No geral, a legislação tem se mostrado eficiente para combater a escalada da violência contra a mulher.
Hoje, as mulheres vítimas de violência podem se utilizar dos telefones 197 (Polícia Civil) e 180 (atendimento à mulher nacional). Mas, conforme orienta a delegada, o ideal é que os casos sejam relatados presencialmente, a fim de que as providências cabíveis sejam tomadas, ou seja, no caso de crimes, a abertura do Boletim de Ocorrência para a investigação do fato. Em Anápolis, a Delegacia da Mulher está funcionando em nova sede, ao lado do prédio da Delegacia Geral, na Praça do Expedicionário, setor central.