
Por Moacir de Melo
Quando escrevemos, em julho de 2025, que sonhávamos ver 50 mil delegados da COP30 transformados em curupiras internacionais, talvez não tenhamos percebido a ousadia do desejo: pedir que o mundo saísse do discurso e entrasse na ação. Pedir que governos que mal protegem suas próprias florestas apoiassem comunidades amazônicas, financiassem vigilância ambiental e encarassem, de frente, o combate ao crime climático.
Era pedir muito?
Sim.
Mas era o mínimo.
E avisamos: sem decisões concretas, o mundo estaria queimando — mais uma vez — nosso personagem de 500 anos, guardião teimoso da vida. Queimando em sentido literal e simbólico.
Pois bem.
A COP30 terminou.
E o que fizeram com o CURUPIRA?
Crucificaram-no.
Sem dó, sem remorso e com boa maquiagem retórica.
Transformaram o guardião da floresta em mascote turístico de conferência: tiraram foto, citaram em discursos, penduraram em banners — e viraram as costas para a floresta que continuou ardendo fora dos salões refrigerados.
O mito virou mártir não porque falhou, mas porque expôs o fracasso coletivo.
O Brasil, país sede, até lutou para construir o “mapa do caminho” do financiamento climático. Mas financiamento não veio.
Vieram discursos. Vieram promessas. Vieram poses.
E, mais uma vez, o documento final foi incapaz de esconder o vexame: dez anos após Paris, a temperatura sobe, e o cumprimento das metas cai.
Mas aqui está o detalhe que os delegados esqueceram:
ninguém endireita os pés do CURUPIRA.
Ninguém.
Agora, seus pés virados servem para denunciar — com precisão brutal — cada falha e cada covardia:
– apontam para fora, cobrando a dívida histórica dos países ricos, que adoram falar de clima, mas detestam pagar por ele;
– apontam para cima, revelando o abismo indecente entre promessas bilionárias e ações nulas;
– apontam para dentro, lembrando ao Brasil que a Amazônia não se protege com discursos, e sim com vergonha na cara, fiscalização, inteligência e coragem política.
A ONU, tardiamente, reconheceu após a COP30 aquilo que qualquer criança ribeirinha já sabe: não existe solução climática sem florestas tropicais. E, sem querer, entregou ao CURUPIRA o posto de símbolo máximo dessa verdade inconveniente.
Porque a natureza, diferentemente dos negociadores internacionais, não negocia, não perdoa e não trabalha com “prazo prorrogado”.
Se a COP teve algum avanço modesto, seu maior legado foi outro: mostrar ao Brasil que nossa floresta é protagonista — e que nosso folclore compreende de sustentabilidade muito melhor do que relatórios técnicos escritos por quem nunca pisou na Amazônia.
O CURUPIRA não morre.
Sobreviveu às queimadas, aos retrocessos, aos acordos vazios.
Sobrevive porque sua função é clara: ele denuncia quem finge cuidar da floresta e expõe quem lucra com sua destruição.
Seu recado pós-COP30 é direto, impaciente e inegociável:
o maior obstáculo da ação climática global é a covardia dos países ricos em financiar o que eles mesmos destruíram.
O guardião da floresta agora caminha irritado, vigilante e impaciente.
E adverte: ou o mundo escuta logo, ou seus pés — sempre virados — apontarão para um caminho sem volta. E este caminho já começou.
E viva o CURUPIRA: eterno, indomável, incômodo — e agora mais necessário do que nunca.
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