A história sempre será, para cada um de nós, um grande problema filosófico, pois não há como fugir dela! Ela pode ser negada, sublimada, mas, assim como a verdade, sempre vai procurar uma forma de se manifestar.
A verdade quer revelar os fatos da história, torná-los transparentes e lúcidos. É como uma boia, que mesmo mantida debaixo d’água, força a volta à superfície.
Tais fatos fazem lembrar a descrição que há no livro de Apocalipse em que, diante do trono de Deus, há um mar de vidro – semelhante ao cristal – onde tudo é transparente, visível. Nada é obscuro ou escondido. Assim ocorre com a história.
Muitos tentam construir narrativas para tornar a mentira, verdade, pervertendo os fatos. Os poderosos sempre quiseram ter o poder sobre as versões que constroem, como se fossem capazes de suprimir a verdade, pensando que são espertos o suficiente para detê-la. Sendo assim, manipulam enredos, criam novas versões, mas a história é sempre poderosa para denunciar e desmascarar os tolos artifícios de manipulação.
É possível usar toda a mídia, acionar o sistema para tentar enganar, mas é impossível fugir da própria história, pois somos prisioneiros dela. Não há como fugir dessa sentença. Alguns afirmam que “a história se repete como tragédia e depois como farsa”. Essa realidade é mais visível na política, mas também está presente na religião e na filosofia da história.
O filósofo alemão Friedrich Hegel, conhecido por sua obra A Fenomenologia do Espírito, é sarcástico ao afirmar que “se a história nos ensina alguma coisa, nos ensina que não ensina nada.” Para Hegel, a filosofia da história está marcada pela “astúcia da razão” e do “escárnio da história”, que denunciam aqueles que acreditam se conduzir de per si e tentam construir narrativas toscas. A história teria então o poder de castigar tais pretensões e as ridicularizaria ao fazer troça deles. Segundo o filósofo, a história se reordena e retrocede sobre si mesma com sarcasmo para ridicularizar a mentira construída.
A verdade é que “à frente de nosso futuro, tem o nosso passado”, como ironicamente pontuou Millôr Fernandes. Por esta razão, para muitos o passado representa uma assombração, um fantasma, sombras e pesadelos. Mas não tem como fazer de conta que o passado não existiu. Os poderosos podem criar as narrativas que quiserem, podem manipular sistemas, criar novas leis, interpretá-las de modo diferente. Podem também julgar baseados em chicanas jurídicas, mas a história e os fatos serão revisitados e a verdade virá à tona. Não há nada oculto que não venha a ser revelado.
E vale lembrar que a história será contada para os amigos, para o namorado, para os filhos e netos. Ela nunca deixará de existir, já que é fato consumado e por isso vai ecoar para sempre. O mesmo vai acontecer com a História do Brasil de hoje. Os fatos serão revisitados, recontados, analisados, escrutinados, julgados. Assim como será nossa história pessoal e o que hoje estamos construindo.
Nossos filhos falarão de nós, darão a versão e não serão românticos nem hipócritas porque o futuro não terá piedade em nos julgar. Podemos construir o que quisermos, mas não podemos fugir do crivo do bom senso e da razoabilidade. A vitória do mal não resiste ao crivo da verdade.
Prisioneiros da Própria História!



