Presente em Anápolis no último domingo, 07, participando das comemorações dos 61 anos de fundação da Igreja Presbiteriana de Anápolis, Russell Shedd, um dos mais consagrados nomes da teologia protestante atual, concedeu entrevista exclusiva ao Jornal Contexto. Aos 84 anos, doutor Shedd, como é chamado pelos seus admiradores, viaja pelo Brasil e exterior ministrando em igrejas, conferências, seminários e faculdades de Teologia.
Graduado em teologia pela Wheaton College (Wheaton, Illinois – EUA) e diplomado Ph.D. em Novo Testamento pela Universidade de Edimburgo, Escócia, o pregador batista/calvinista, como auto se define, é autor de vários livros como “A Justiça Social e a Interpretação da Bíblia”; “Disciplina na Igreja”; “A Escatologia do Novo Testamento”; “A Solidariedade da Raça”; “Justificação”; “A Oração e o Preparo de Líderes Cristãos”; “Fundamentos Bíblicos a Evangelização”; “Teologia do Desperdício”; “Criação e Graça: reflexão sobre as revelações de Deus”. Russell Shedd é, ainda, editor responsável pelos comentários da Bíblia Shedd/Bíblia Vida Nova, muita difundida, principalmente, entre os evangélicos em todo o Brasil.
– Como o Senhor analisa o crescimento de outras religiões e seitas em todo o mundo, numa espécie de ameaça ao cristianismo?
R: Minha opinião é que esse crescimento já está previsto na palavra. Antes da volta de Cristo haverá esse esfriamento da parte da igreja e que abre a atuação por parte do demônio nessas regiões.
– No Brasil, o papel da Igreja vem sendo cumprido dentro das expectativas, ou, há algo mais a ser feito em termos de catequese, doutrinação e crescimento da proposta cristã?
R: Sem dúvidas. O problema é que não temos acesso a vários desses mais de 40 milhões dos chamados evangélicos para pode discipular, porque não compram os livros, não assistem os trabalhos que a gente faz. Eles ficam isolados e dependem do que seus líderes estão ensinando.
– A igreja, principalmente a do segmento evangélico protestante, estaria, de fato, cumprindo o seu papel no Brasil, ou o senhor enxerga alguma distorção no trabalho dela?
R: As distorções são mais visíveis em certas áreas do quem outras. Vê-se a idéia de que se pode mandar em Deus, ou decretar algo como que se ele fosse nosso escravo.
– Na sua visão, como deveria ser a atuação da igreja no Brasil, na busca de melhor qualidade de vida para o povo e na melhor aproximação com o discipulado para seu fortalecimento?
R: Nós temos, em certos lugares do mundo onde o evangelho tem tido mais profundidade e mais divulgação durante varias gerações, uma qualidade de vida melhor. Acho que é isso que esta faltando no Brasil. Talvez, daqui umas duas ou três gerações, poderá ter. Mas não vai ser de um dia para o outro.
– Historicamente a Igreja sempre teve papel preponderante na construção da sociedade. Mas, de uns tempos para cá, em todo o mundo, parece que há uma certa apatia quanto a isso. Qual é a sua visão a respeito disso?
R: Eu entendo que, até certo ponto, as predições relativas à volta de Cristo é que o mundo vai escorregando mais no poder satânico. Nós não podemos esperar muita mudança na própria sociedade. Eu posso estar errado. Com certeza em certas áreas a sociedade tem mudado para melhor. Mas, eu tinha grandes esperanças que depois da queda do comunismo na Rússia, aquele país ficasse mais aberto para o evangelho. Mas de fato ele tem se fechado em torno da igreja chamado ortodoxa, dificultando muito o trabalho missionário lá e a abertura para o trabalho do Senhor. A gente esperava mais evidências de oportunidades no Afeganistão, no Iraque, na Síria e no Líbano também.
– O Senhor entende que a Igreja deveria se manter, apenas, no posicionamento fundamentalista de doutrina e religião, ou, poderia se envolver mais nas questões sociais?
R: Ela se envolve nas questões sociais, através das conversões reais das pessoas. Uma cidade com crentes no governo, nas lojas, nas fábricas- estou falando de crentes de verdade e não apenas crentes de nome- pode ver uma melhora na sociedade. Se tentarmos inverter esse sistema, acho que será muito complicado. Foi justamente o que aconteceu no caso daquelas teologias da libertação, essas idéias que enfatizaram na América chamado de evangelho social, que em vez de melhorar, a coisa piorou.
– Qual é a sua opinião sobre o envolvimento das autoridades religiosas, em geral, na política partidária? Ela seria salutar, ou, de alguma forma, distorceria sua função eclesiástico-pastoral?
R: Ela tem um papel muito importante de mostrar biblicamente o que está errado em certas práticas e injustiças que são cometidas pelos líderes no governo. Essa procura por justiça, essa tentativa de distribuição correta do dinheiro arrecadado é uma função do cristianismo. Uma forma de usar a capacidade que o governo tem de melhorar a vida dos mais necessitados, mas não sei se muitas igrejas estão envolvidas nesse propósito.
– O senhor acredita que o líder religioso teria como conciliar sua atividade pastoral, por exemplo, com a ocupação de cargos político-eletivos?
R: Eu acho muito difícil por uma só razão: para qualquer legislação passar pelo Congresso tem que haver combinação com pessoas e parcerias criadas que façam com que as leis sejam votadas. Isso, às vezes, compromete o próprio testemunho da pessoa. Acho que o trabalho dele é principalmente de instrução, chamar atenção e orar muito, como a Bíblia manda.
– Que papel deveriam adotar os líderes religiosos do Brasil, neste ano de grandes decisões, com a escolha do Presidente da República, governadores, senadores e deputados em relação aos seus fieis?
R: Líderes religiosos têm um papel importante em poder dizer o que realmente vale a pena lutar para modificar. Uma das áreas que certamente esta sendo falada bastante, inclusive, por não crentes, é a corrupção. Agora outras áreas, é justamente tentar dar para aquelas pessoas mais necessitadas oportunidades. Vejo por exemplo, projetos de levar água para lugares como no Nordeste, região que sofre coma seca, para que as pessoas que sofrem terem pelo menos o básico. Conseguirem plantar seu arroz com feijão.
– O Estado Brasileiro tem reconhecido o trabalho que as igrejas realizam no campo social, como atendimento aos setores carentes aonde o braço oficial do Governo não chega?
R: Especialmente nas áreas das drogas e alcoolismo. Qual é o ramo do governo que cuida dessas pessoas e transforma suas vidas, trazendo dignidade a elas novamente? Quem está trabalhando? Como o Governo consegue tirar e manter pessoas fora das drogas? Às vezes, nós tentamos tirar e eles voltam. Tem que ter essa ideia da conversão, genuína, não é?
– A propósito, sobre este tema, o Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas prepara uma resolução pela qual as comunidades terapêuticas, clínicas de recuperação, não poderão mais falar sobre religião com os seus pacientes. Como o senhor vê isso?
R: É ridículo. É como dizer que vamos recuperar a pessoa sem falar com ela. A gente sempre tem que falar. E precisa falar a verdade, que se a pessoa não tem Cristo como seu Senhor, não tem a palavra de Deus como regra de vida e prática, então ela não vê nada de errado e volta para o mundo das drogas.