Dentre as muitas revelações que o covid-19
trouxe para o Brasil, nenhuma se compara, pelo menos até agora, com a descoberta de uma população fantasma.
São mais de três milhões de brasileiros que existem, mas, é como se nunca tivessem existido. Eles não foram registrados quando nasceram e, portanto, são uma espécie de zumbis. Gente que não tem RG, não tem CPF, não faz parte da Previdência Social, não tem acesso aos benefícios sociais. E, lamentavelmente, é um fato que atravessa gerações. Os pais e os filhos, também, vivem da mesma forma. Nos grotões, nas favelas, nos bolsões de miséria, (sobre) vivendo de arremedos de projetos urbanos e rurais.
E, não é só nas terras longínquas e remotas que isto ocorre. Nas chamadas grandes cidades, também, estão muitos desses seres. Agora mesmo, com o chamamento para se receber o tal auxílio emergencial, muitos ficaram de fora pelo simples fato de não portarem um documento sequer. O último dado do IBGE é de 2015 calculou que três milhões de pessoas viviam nessa situação.
Mas, o número pode ser muito maior. Em um país de tantas desigualdades como o Brasil, estas pessoas podem ser classificadas como não-cidadãs, se é que existe este termo. E, saber que são estes os mais necessitados e expostos. Enquanto isso, comprovadamente, pessoas que não precisam, e não merecem, usam da desonestidade para conseguirem tais ajudas.
A realidade mostra que esses brasileiros passam à margem de qualquer tipo de ação do estado. Não têm o registro básico, que é a certidão de nascimento. Tais sujeitos vão ser informais a vida toda, vão ser desprotegidos a vida toda, o que numa situação de pandemia é um risco de vida. A não ser, claro, que haja uma reviravolta nas políticas sociais deste País e que eles sejam alcançados, pelo menos, com uma oportunidade de se inserirem socialmente.
E, a coisa só não é pior porque a sociedade tem sido solidária, as organizações não governamentais os clubes de serviço e outras instituições estão fazendo o papel que seria dos governos, ao ampararem esses abandonados.
Todavia, pelo o que se observa, os governos, em geral, não se interessam por estes não-cidadãos, principalmente porque eles não votam nas seguidas eleições. Mas, são contribuintes, mesmo que de forma indireta, porque em um simples quilo de arroz que conseguem comprar, pagam os tributos embutidos no preço da mercadoria.
O fenômeno covid-19 vai passar, como muitos outros passaram. Mas, as cicatrizes que deixará, por certo, durarão uma eternidade.