Segundo o presidente da OAB de Anápolis, o que existe é um duelo jurídico entre a liberdade individual e o interesse coletivo
Jorge Henrique Elias
(Presidente da OAB Anápolis)
Com a Internet, a sociedade perdeu a referência do noticiário oficial, ao mesmo tempo em que está exposta à uma série de formadores de opinião, promovendo choques de ideias que, muitas vezes servem mais como desinformação. Aos olhos da lei é possível trazer a verdade à tona, municiando o leitor com o que diz o ordenamento jurídico.
Não erra quem diz que a vacinação é obrigatória no Brasil. A Lei 6259/75 esclarece que o Governo Federal é o responsável pelo PNI – Plano Nacional de Imunização, que obriga a população a receber as vacinas que façam parte desse plano, embora não estabeleça penas para quem deixar de se vacinar. A única exceção está prevista no artigo 29, que dispensa quem apresentar atestado médico de contra-indicação.
A Lei 13.979/20, veio para corroborar essa obrigatoriedade, colocando o bem da coletividade num patamar superior ao da liberdade individual, determinando a “realização compulsória” da vacina, em se tratando de uma pandemia de “importância nacional”, ao se referir à Covid-19. Lei que passaria sem muito questionamento, caso não houvesse um elemento político permeando o pensamento coletivo, afinal, para evitar mortes e a propagação do vírus, todos precisam se vacinar. Confesso que me causa espanto uma discussão como essa, durante uma pandemia e em pleno século 21.
Mas, já que o componente político se instalou no seio popular, o mesmo ordenamento político prevê que o cidadão possa questionar tal obrigatoriedade junto ao STF, invocando, através de ação, seu direito constitucional de liberdade. O próprio Governo Federal, para dirimir o crescente clima de revolta, declarou oficialmente que não haverá obrigatoriedade na vacinação. Tudo isso porque as vacina produzidas em tempo recorde foram postas em xeque pelos presidentes dos Estados Unidos e do Brasil. Caso contrário, acredito que o clima seria mais pacífico. Mas, se perguntado, eu, Jorge, responderia que vou me vacinar para me proteger e para proteger minha filha de 7 meses e minha mãe de 74 anos. Recomendo à todos que façam o mesmo.
Qualquer semelhança não é mera coincidência

Essa não é a primeira vez que a população brasileira se vê envolvida em polêmica sobre vacinação
A Revolta da Vacina foi uma rebelião popular contra a vacina anti-varíola, ocorrida no Rio de Janeiro, em novembro de 1904. Quando o presidente Rodrigues Alves assumiu o governo, em 1902, nas ruas da cidade do Rio de Janeiro acumulavam-se toneladas de lixo. Desta maneira, o vírus da varíola se espalhava. Proliferavam ratos e mosquitos transmissores de doenças fatais como a peste bubônica e a febre amarela, que matavam milhares de pessoas anualmente.
Decidido a reurbanizar e sanear a cidade, Rodrigues Alves nomeou o engenheiro Pereira Passos para prefeito e o médico Oswaldo Cruz para Diretor da Saúde Pública. Com isso, iniciou a construção de grandes obras públicas, o alargamento de ruas, avenidas e o combate às doenças.
Era necessário combater o mosquito e o rato, transmissores das principais doenças. Por isso, o intuito central da campanha era precisamente acabar com os focos das doenças e o lixo acumulado pela cidade.
Primeiro, o governo anunciou que pagaria a população por cada rato que fosse entregue às autoridades. O resultado foi o surgimento de criadores desses roedores a fim de conseguirem uma renda extra.
Devido às fraudes, o governo suspendeu a recompensa pela apreensão dos ratos. Contudo, a campanha de saneamento realizava-se com autoritarismo, onde as casas eram invadidas e vasculhadas. Não foi feito nenhum esclarecimento sobre a importância da vacina ou da higiene.
Num tempo onde as pessoas se vestiam cobrindo todo o corpo, mostrar os seus braços para tomar a vacina foi visto como “imoral”. Assim, a insatisfação da população contra o governo foi generalizada, desencadeando a revolta.
Agitadores incitavam a massa urbana a enfrentar os funcionários da Saúde Pública que, protegidos pelos policiais, invadiam as casas e vacinavam as pessoas à força. Os mais radicais pregavam a resistência à bala, alegando que o cidadão tinha o direito de preservar o próprio corpo e não aceitar aquele líquido desconhecido.
O descontentamento se generalizou, somado aos problemas de moradia e ao elevado custo de vida, resultando na Revolta da Vacina Obrigatória. Entre 10 e 16 de novembro de 1904, as camadas populares do Rio de Janeiro saíram às ruas para enfrentar os agentes da Saúde Pública e a polícia.
O centro do Rio de Janeiro foi transformado numa praça de guerra com bondes derrubados, edifícios depredados e muita confusão na Avenida Central (atual Avenida Rio Branco).